domingo, 9 de junho de 2019

O ÚLTIMO ROMÂNTICO: SOBRE O NAMORO

Namaro,  de origem latina, palavra etimologicamente derivada de amor. Originária da expressão Espanhola estar en amor, que acabou formando o verbo enamorar,  da onde  resultou o nosso namoro. Seu maior significado é de inspirar amor, encantar, apaixonar-se e /ou desejar.
Sob perspectiva psicológica, namoro incialmente, implica em querer fazer parte do desejo do outro, cobiçar, querer estar junto. Por meio do enamoramento sentimos a aura mágica na qual qualquer objeto é transformado em símbolo para enlaçar-se e nos  diz que somos especiais,  não apenas mais um, trazendo a esperança de que tais mimos se perpetuarão. “É promessa de vida no meu coração”.
Amor prescinde do raciocínio, requer somente intuição. Expectativa do encontro com sua alma gêmea, a metade da laranja, isto é, com sua própria existência.
Neste momento peço licença à minha mãe para trazer sua linda recordação do namoro com meu pai de que ele sempre chagava para o encontro com um bombom sonho de valsa.
 E a magia ocorre quando estamos enamorados de um outro que não seja a nossa imagem e semelhança, mas  um outro, a quem desejamos.
Namorar requer conexão. Conexão com um diferente de nós, implica em troca, reciprocidade.
Para Botton, os anseios instantâneos da paixão dificultam a real vivência do amor. O filósofo também aponta que manter o relacionamento requer mais habilidade do que entusiasmo. Como diz Botton “Aparentamos saber muito sobre como começa o amor e quase nada acerca de como ele pode durar”.
Embarcando nos trilhos da história do amor, lembramos que o amor romântico nem sempre existiu já que surgiu no final do Século XVII.  Depois, ganhou significado de busca de compatibilidade e a complementaridade entre o homem e a mulher.   Os pós-guerras mostraram-nos seu legado tecnológico, o advento da pílula e uma revolução nas relações afetivo-sexuais. Valores como individualismo e liberalismo consagrados na carta de Direitos Humanos passaram a predominar e o amor romântico foi cedendo lugar ao amor baseado em relações equânimes, na reciprocidade do prazer e na utilidade que tem para cada um. Os vínculos tornaram-se fulgazes,  transitórios, frágeis, líquidos. É o “ficar”, tipo de testagem para o namoro, o “pegar”, relação descompromissada.
Não podemos nos omitir  sobre a importante alteração nas interações afetivo-sexuais com o advento da internet e redes sociais.
No entanto, os diferentes tipos de amor não são exclusivos de determinada época, coexistindo entre os tempos; tal como hoje podem andar lado a lado o excesso de comercialização do amor romântico e o prazer imediato, o gozo pelo gozo.
Apesar disso, a necessidade de formar laços e nos apegarmos é inegável.  Quem nos mostrou de forma genial isso foi John Bowlby ao desenvolver a Teoria do Apego. Para Bowlby  os conflitos dos relacionamentos conjugais remontam  às nossas primeiras experiências de cuidados parentais. Pessoas com sentimentos de abandono em sua infância, tendem a desenvolver  comportamentos  ambíguos: inicialmente inseguros, temerosos, dependentes, controladores e,  depois  refratários à intimidade,  buscando isolamento, necessidade de espaço. O amor, entendido por Damásio e De Waal como emoção básica, leva  tem função adaptativa  já que ele leva à reprodução e à protecão ao filhote, apego (attachment)  além de ser  responsável pelo surgimento dada empatia.
 Contudo Botton  cita : “O amor é uma habilidade a ser aprendida não apenas uma emoção."
Retomando o amor romântico, para Botton  o difundido por Hollywood é um deserviço à felicidade.
Por exemplo: o mito da alma gêmea pode propiciar que esperemos que o companheiro nos compreenda perfeitamente sem que tenhamos que falar nada.
Namoro, relacionamento desenvolvido, em geral, para possibilitar que os apaixonados se conheçam. Você precisa permitir-se conhecer, mas como? Para isso, não é preciso antes você ter autoconhecimento? Muitas das vezes acontece o jogo do esconderijo, nos quais os parceiros querem mostrar-se perfeitos.  
Idealizamos o namoro, romantizamos a vida e ao nos depararmos com o ser humano de carne e osso, com defeitos e limitações nos decepcionamos e desiludimos e sucumbimos sem tentativa de diálogo e qualquer esforço.
A seguir parte do poema  “A lamentável história dos Namorados” de Carlos Drumond de Andrade:
Namorados, namorados, não vos vejo mais alados,
sublimes, alcandorados nos miríficos estados
de êxtases multiplicados em horizontes dourados de mundos ensolarados.
Estais casmurros, calados entre carinhos cansados e sonhos desanimados. ......” .
Dependemos de nossos próprios códigos, nossas crenças, nossas experiências, nossos códigos, que podem ser deficientes, para decifrarmos a situação atual. Portanto, enganamo-nos ao interpetarmos o comportamento do outro, nem sempre julgamos com imparcialidade,  acuidade o (a)  namorado (a). Por vezes, supervalorizamos o sexo na relação amorosa.  Tentamos ler o pensamento do outro, ao inves de lhe perguntarmos. Tentamos adivinhar o comportamento do parceiro, generalizamos, tiramos conclussões precipitadas,dentre outros pensamentos disfuncionais.
E as pressuposições falsas, levam-nos a enxergar o outro negativamente, ao ressentimento e a culpá-lo pelo desentendimento.
Vele comentar que Becck, pai da terapia cognitiva, ao abordar o amor, sempre faz questão de registrar que suas considerações têm validade sejam os companheiros do mesmo sexo ou não indicou.
Acreditamos que as interações são fáceis, que não requerem dedicação, habilidade, aprendizagem e, ao contrário “amar se aprende amando” como já dizia o poeta.  O namoro requer constante dedicação, habilidade e construção.
Como tudo não são flores, bombons, joias e alianças de compromisso, é também preciso   falarmos da violência no namoro; lamentavelmente, cada vez mais frequente em minha extensa prática profissional .  
Pesquisa efetuada com 3.205 escolares do 2º ano do Ensino Médio, com idade entre 15 e 19 anos, de escolas públicas estaduais e particulares das capitais de dez estados brasileiros resultou que o aumento do número de eventos de violência psicológica perpetrada pelos adolescentes em seus relacionamentos íntimos está relacionado à mais elevada agressão verbal da mãe e do pai; e à mais frequente vivência de violência psicológica entre pais, irmãos, amigos e àquela presente nos namoros anteriores (Oliveira, Queiti Batista Moreira,  Gonçalves de Assis , Simone , Njaine Kathie , Pires,  Thiago Oliveira, 2013).
Em face da falta de limites e compromissos, da ausência de contratos (mesmo que implícitos velados) entre os namorados, do uso do outro como objeto imediato de seu gozo, o namoro, daquele de cortejar, do encantar passou também a ser interação de horror, haja vista até muitos homicídios cometidos já neste prematuro relacionamento.
Enfim, histórias de amor são mais que os momentos iniciais do relacionamento pois são como o casal se relaciona dez anos depois. Por que nossa realidade não pode ser empolgante e fascinante já que mesmo com imperfeições, defeitos, desafios, são o fiel retrato do amor?
Fernanda Mendes Lages Ribeiro,  Joviana Quintes Avanci,  Lusanir Carvalho,  Romeu Gomes e  Thiago de Oliveira Pires (2011) mencionaram em seus estudos que os jovens de hoje, ao mesmo tempo que recriam novas formas e novos meios de se relacionar, em que o ‘ficar’ e a Internet são o novo, repetem e reproduzem alguns modelos relacionais tradicionais e conservadores, expressos em suas falas e no trato com o parceiro ou a parceira.
Por que não curtir a dança, a sintonia, a participação dos dois parceiros, enfim,  nos permitirmos nessa vivência espetacular e das mais enriquecedoras e humanas? 


#psicologianaveia
#amor
#psicologiadasexualidade
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#namoro

REFERÊNCIAS:
DRUMOND, C. A. Amar se aprende amando.  São Paulo, Companhia das Letras, 2008.
OLIVEIRA, Queiti Batista Moreira,  GONÇALVES DE ASSIS , Simone , NJAINE,  Kathie , PIRES,  Thiago Oliveira, Namoro na adolescência no Brasil: circularidade da violência psicológica nos diferentes contextos relacionais,  2013
RIBEIRO, FML., et al. Entre o ‘ficar’ e o namorar: relações afetivo-sexuais. In: MINAYO, MCS., ASSIS, SG., and NJAINE, K., orgs. Amor e violência: um paradoxo das relações de namoro e do ‘ficar’ entre jovens brasileiros [online]. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2011, pp. 55-86. ISBN: 978-85-7541-385-2. Available from SciELO Books <http://books.scielo.org>.

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