sábado, 26 de maio de 2018

MÃE, (DES) NECESSÁRIA MÃE.

                                                                                                             Cláudia Maria Tamaso



Às vésperas do Dias das mães, outono de 2018, não poderia deixar de escrever e compartilhar com você sobre a figura materna.
Maternidade, determinada biologicamente, no entanto, maternagem, isto é, o exercício da função materna requer contextualização.
Caminhando pelos trilhos da história vemos que o sentimento de infância somente emergiu século XVIII.
A criança pequena não contava. As mães, sequer amamentavam seus filhos.
Com a concepção higienista, pensamento de Rosseau e advento da psicanálise, emergiu a necessidade da função materna, ou seja, a importância dos cuidados maternos.
Portanto, há pontos de vista, bem considerados de que o instinto materno inexiste e isso verificamos pelo crescente número de famílias sem filhos, pelo filicídio materno.
O ser mãe implica em papel que modifica-se através dos tempos, de acordo com contextos socioculturais. Ser mãe não nasce pronto. Aprende-se, constrói-se a partir da sua interação com a própria mãe.
Hoje, é indiscutível que a relação mãe/filho já desde fase intrauterina é primordial para o desenvolvimento humano. No entanto, isso não quer dizer que a função materna não possa ser desenvolvida por uma pessoa substituta, que não a genitora, o (s) cuidador (a).
Sob concepção psicanalítica, há algumas ideias rejeitadas, outras mais consensuais. Há divergências, principalmente sobre ideia da maternidade como realização da feminilidade. Nesta vertente, considerando a inveja feminina do pênis pelas mulheres, o filho seria o falo e tê-lo significa ter o rei na barriga, o sagrado. Contesta-se apontando que a mulher realiza-se também enquanto um ser pleno em sexualidade e profissão.
Enfim, por meio do filho a mãe resgata seus sonhos, seus desejos.
Para exercer a função materna é preciso emergir o desejo do filho, desejo este que estrutura-se conforme os afetos, as condições psíquicas da mãe.
Já sob ótica da análise do comportamento, geralmente, a mãe é a pessoa que dispõe de reforçadores para propiciar o desenvolvimento e aprendizagem infantil. É a mãe, que no estágio de total dependência do bebê, que o nutre, propicia sua higiene, lhe dá o calor, a proteção, lhe mostra o rosto e olhar humano, que faz o filho perceber-se desejado, amado.
O comportamento, começa no início da vida, envolto em interelação de contingências.
O processo de desprendimento entre mãe e filho inicia com o parto, mas de modo demorado e gradativo, transforma os relacionamentos familiares. Em um jogo de aproximar-se e distanciar-se mãe e filho vão refazendo e cortando o cordão umbilical até o ciclo recomeçar quando a filha torna-se mãe.
Por isso, a mãe precisa tornar-se desnecessária, no sentido de que a mãe contenha-se em aprisionar o filho debaixo de suas asas, de envolve-lo em uma bolha isenta de perigos e tristezas e permita-lhe alçar vôos. Afinal, toda mãe deseja que o filho não sofra, mas isso é uma tarefa inglória, impossível já que o sofrimento e dor são inerentes ao humano. Tornar-se desnecessária é possibilitar a gradativa autonomia do filho, permitir que torne-se um sujeito, não objeto.
Ser mãe exige firmeza, desprendimento, maturidade, flexibilidade emocional, empatia, assertividade e capacidade de elogiar e enxergar os próprios limites, muito mais que perdas de horas de sono.
Mãe não tem que ser infalível, mas aceitar suas falhas e acreditar que, a maioria delas possam ser corrigidas sem maior impacto e danos psíquicos aos filhos.
Retirando a culpa por vezes percebida pela psicanálise freudiana, Winnicott nos trouxe a mãe “suficientemente boa”, ou seja,; a que acolhe o desamparo, traz segurança, que apresenta –se ao filho enquanto mulher. Mãe, mulher de um homem desejante, não sendo, portanto, exclusivamente mãe, mas um trinômio ( mãe- mulher- filha).
Atualmente ser mãe não implica em viver exclusivamente para os cuidados com o lar e filhos. A mãe pós-moderna abriu-se ao mundo público, ao externo, à cultura. O terceirizar os cuidados, seja profissionalmente, seja aos avós, já gera menos culpa.
A realidade impõe que ser mãe é uma função; portanto, não da ordem do instinto, mas da cultura. A mãe pós-moderna, por vezes veste calças e camisas, por vezes tem a força mantenedora da casa, por vezes não gerou o filho que acalanta.
Mais do que gerar, ser mãe é exercer os cuidados, apresentar o pai, lidar na gangorra do amor/hostilidade, ressentimento/perdão.
Levando-se em conta que a importância da mãe em nossas vidas, o perdão à mãe é um perdão a si próprio e ao mundo.
Mãe, pessoa vital. Mãe (des) necessária mãe.

#psicologianaveia

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